A Compreensão

Cá estou, uma vez mais escrevendo, fazendo por ultrapassar este sentimento de orfandade e solidão que tantas vezes me assola. É curioso que me assola estando na mesma rodeado de gente, numa grande cidade... talvez me assole precisamente por estar numa grande cidade, rodeado de gente. Ainda que eu goste dele em retrospetiva, por me dar uma sensação de importância, por gostar das coisas tristes, não é fácil de digerir e às vezes é exacerbante, e também para isso serve este texto.
Creio que muito mais gente se sente assim por essas cidades fora, quando tem tempo para si, um sentimento de solidão, de não pertença, de deslocamento, um pensamento que há algo profundamente errado com fazer tudo igual, com a rotina, com não ter com quem partilhar as coisas, e a esses respondo que tem sempre a escrita, que é um poderoso aliado, que vos pode fazer muito bem. Muitos jovens sobretudo, a darem os seus passos neste mundo tantas vezes duro, em cidades diferentes das de origem, e a solidão é uma coisa curiosa, pois nós vamos precisando muito dos outros, nós refugiamo-nos muito nos outros, mesmo ao longo de toda a vida, mesmo adultos e homens de barba rija... enfim, haverá porventura solução para esse problema.
No outro dia reencontrei-me com uma frase curiosa na minha faculdade, é é sobre isso que vos quero falar neste texto, uma frase de Petrarca; era a seguinte: " Os livros, ao longo do tempo, tem levado umas pessoas ao saber e outras à insânia"
Esta frase é interessante para constatar algo que me alegra, que a minha compreensão aumentou significativamente desde há alguns anos. Não falo aqui somente de perceber algo, mas de uma compreensão que se torna viva em nós, saber algo de coração, algo que se torna nosso, absolutamente claro. Quando a li pela primeira vez não percebi muito bem o que queria dizer, ou fiz uma interpretação limitada em comparação com a que faço hoje. Hoje tenho uma muito maior perspetiva sobre o que quer dizer, um conhecimento muito maior do mundo. Será envelhecer assim tão mau quando se aprende? Claro que não, pena é que tantos não aprendam coisa nenhuma. De facto, os livros levam uns a um aprofundamento daquilo que já sabem no seu coração, e ajudam muitos no seu caminho e na sua compreensão, e para outros são somente más interpretações, intelectualismo, opiniões e não saber, como dizia Sócrates. Isso leva-me a questionar sobre o que é que é um livro, qual é o seu valor intrínseco, e mais uma vez podemos ir ao que diz Platão na sua crítica à escrita, que ela não se compara ao diálogo, à dialética... contudo, a escrita e os livros parecem ter o seu lugar, nem que não seja pelo simples facto que fazem bem a quem os faz, sejam uma forma de expressão, e porque a vida é muitas coisas, e as coisas servem para várias funções; é incontornável que tenha as suas consequências, e o bem sobre passa em muito aquilo que é mau neles, cabe a cada um fazer o seu julgamento, ou usá-los com prudência.
Acredito que em retrospetiva verei que ter posto esta questão não faz sentido, como sempre acontece quando há saúde, quando há crescimento, quando há mais maturidade, e, por vezes, compreensão; mas enfim, para já ela ecoa em mim...
Caminhamos, de certo, e isso foi provado com esta explanação, para mais paz, nem que ela venha por intermédio de muito sofrimento, e isso poderá servir para termos uma perspetiva mais positiva da vida, do que ela é, que é sempre somente uma ideia, nunca a globalidade, mas que serve para irmos andando, para irmos vivendo, para irmos às vezes às cegas caminhando para onde temos de chegar. Bem hajam!